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quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O PRÉMIO

“Queres ir ao Shopping?” Telefonava-me uma amiga, há largos dias. “Não quero, mas preciso de ir”. Combinámos o encontro, peguei na lista das compras e pus-me a caminho.

Passeámo-nos pelos corredores do Continente, eu empurrando o carrinho, ela colocando as compras nele, adquirindo os precisos de uma e outra, conversando e rindo de tantas banalidades, que acabei esquecendo o que anotara em primeiro lugar: pilhas para a escova de dentes. Não foi por isso que veio mal ao mundo; há uma loja do Pingo Doce aqui tão perto…
Feitas as compras, distraída e desejosa de sair do Centro Comercial, surge, como que do nada, a minha “fada-madrinha” que, tal como nós, pretendia fazer uns investimentos de capital, para júbilo do Tio Belmiro.

A minha “fada-madrinha” é a professora JS, mais jovem que eu, que à data em que fui monitora dos adultos na Escola Amarela, em regime de acumulação com o trabalho na Escola Branca e com a supervisão de estágios pedagógicos, se encontrava destacada no Ensino Recorrente. Eu ganhava por esse trabalho a extraordinária verba de dez mil escudos, que pagavam o meu trabalho diário de duas horas, cinco dias por semana, ou seja quarenta horas mensais. Para que não tenham o trabalho de fazer a conta, eu esclareço que recebia a avultadíssima quantia de dois escudos e cinquenta centavos, por cada hora. A minha empregada doméstica ganhava muito mais! Além de pagar mal, o estado nunca pagava atempadamente. Nunca se sabia quando chegava o cheque, mas quando aparecia a JS telefonava a informar-me de que já havia dinheiro. Foi assim que passou a ser a minha “fada-madrinha”. Quando ela telefonava eu já sabia que se alguma vez fora pobre, a partir daquele momento, deixara de ser…

Não sei como, a conversa derivou para a escola. Ter-lhe-ei perguntado se já estaria aposentada? Não recordo. Sei que me falou de trabalho, do sonho de uma pesquisa de cariz pedagógico/didático em que um dos instrumentos a analisar seria o livro de leituras da 1.ª fase do Ensino Primário de que sou coautora: “Rebola a Bola”. Manifestando admiração por um trabalho de meados da década de setenta do século passado, possuir textos que não encontrou em manuais da década de noventa. Não me dei ao trabalho de explicar que os manuais talvez se inserissem em propostas metodológicas diferentes, limitei-me a saborear o elogio, enquanto me batia no peito uma vontade imensa de voltar aos trabalhos de cariz pedagógico.

“Sabe que Eduardo Perestrelo ganhou um prémio com a ilustração do seu livro?” Soubera e já esquecera, mas hoje, assim que saí da cama, nem sei se terei sonhado com isto, dirigi-me à estante e tirei da prateleira o único manual que possuo, aquele por onde a minha filha mais velha aprendeu a ler. Passei as folhas uma a uma, lentamente, deleitando-me com o traço firme, cheio de cor e movimento de Eduardo Perestrelo. Além do prémio de ilustração, o artista deveria ser premiado pela forma ímpar como entendeu a essência do trabalho que lhe confiei.


Uma vez mais, porque nunca é de mais, bem-haja Eduardo Perestrelo! A sua extraordinária mestria fez daquele manual uma obra de arte.










4 comentários:

  1. Fiquei com curiosidade, para além do avô, não há meninos nesse livro?
    :)

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    1. Publiquei uma página ao acaso.
      Neste livro há imensos meninos e meninas. Logo na capa vê dois meninos e uma menina.
      Acredite que o trabalho de ilustração está mesmo uma maravilha.

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  2. -

    É golo, é golo, é golo é golo é golo!

    Era o ... Perestrelo, sim senhora!

    Quantas saudades de o ouvir quando o Benfica marcava um daqueles golos que vinham mesmo na hora certa!
    -
    Por momentos ainda fiquei na dúvida!... Ignorância a minha, ou desmemória do que já aprendi...
    Por isso é que nas provas orais, às vezes lá vinha aquela: " Eu sei mas não me lembro..."

    Fui fazer uma consulta Googliana e lá está "Eduardo Perestrelo" com todos os seus predicados de ilustrador e pintor em geral. De certeza que já observei trabalhos seus!...

    Enfim, fiquei a olhar para a bola e esqueci-me de fixar o nome do artista maior!

    Ora então tem trabalhos publicados em livro/papel e não dizia nada?

    Um abraço

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    1. Olá, António.

      Que bom haver Google! O Perestrelo de que falo é outro que não o que a memória lhe trouxe de imediato. Eduardo Perestrelo é um extraordinário ilustrador, um artista.

      É verdade que tenho outros trabalhos dados à estampa, mas não me parece importante falar do que fiz.

      Um abraço também para si.

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